enredo antigo sob o sol
sim, amor.
você, a quem assim vocativo
(brega e ridícula como todas as submetidas)
vai também, vai tambem-
uma outra vez tal qual todas
se agarrar à média.
você, amor,
vai delicadamente descarnar minha fé
reinventando as acepções pluralistas
e mais exóticas
da traição
entre fiel e leal, há uma infinita bulevar
e enquanto você
assume o primeiro como espécie de privatização
repele da consciência
que o compromisso é órfão de promessa
que os gestos trocados não pressupõem segredos
e que as juras
as juras-
não admitem contrato
mês a mês, eu me debato
vis a vis implicada em não sumir
do teu afeto raso
e dou a cara-
ao tapa
mas também ao afago e à carícia
pra balancear
tua omissão
porque, pra você,
entre mentira e omissão
também há uma infinita
(mas fajuta)
bulevar
relativizando a estória histórica
e minha ferida que esgarça pungente
bramindo a arrogância do seu conforto
pois que você nunca careceu abandonar
o seu leito — o seu ninho de ouro
e sim, você é sempre mais inteligente
letrado e acadêmico
racional e analítico
senhor das referências e eu
serva
serva só dos latidos
essa minha língua que descobre tua boca
não é a mesma com a qual você argumentaria
sou eu o invólucro
não muito mais que um depósito
pronta e mansa
à tua indefinível superioridade
você também vai
muito querido e cheio de tato
me amiudar na toca da qual
esbravejo há séculos
pra cortar cordão
em passos curtos e harmônicos
você pisa meus pés e
detona o assoalho
onde são guardados, indigentes,
tantos dos cadáveres
gêmeos de mim
e você continua aquele em nome do qual
larguei posturas pra caminhar ereta
mas apenas sob
sob tua sombra imponente
porque antes de ser a mulher
que te chama meu amor
antes de ser aquela
de opiniões vitais e conteúdos embasados
eu sou uma-zinha
diminuta e irrelevante
que segue discípula a sina
a mulher que dispara do subsolo
fazendo pactos e sacrificando natureza
porque se encantou
com uma ideia
que camufla joelhos prostrados
eu prevejo, e não por presunção,
mas pelos sinais em evidência
e pelas sinapses que você desautoriza
— e você dirá
o ditado genérico —
que eu distorço e deturpo
e sigo raciocínio emocional
e não sei discutir sem descontrole
e não sei amar sem ódio
a minha ira é una com o carinho
porque jamais me permitiram
qualquer carícia seca de decepção
então por que?, você me pergunta
se eu creio no que creio
é porque eu também
eu também vou-
cumprir a ordem de me relevar
furando meus olhos
sangrando à toa
por teatro, você certifica
como se o hematoma
concebesse
fingimento
você é um outro-zinho
ao qual me recolho, sucumbida ao elástico,
que estala de volta
e me mantém tão feminina
como uma rosa rosada coagida
a desistir do sol
mente e dissimula
e me engana com a docilidade-disfarce
retoma assuntos há muito mortos
até que eu me inverta
da confusão
à vilania
mas se não isso, te chamaria conivente
se não isso, te chamaria cúmplice
se não isso — o latente.
mas se não isso, o que seria?
é o exato mais do mesmo em que eu ceguei
perdoando e regando alternativas-desculpas
igual hábito
de infringir minha integridade
e violar a minha exaustão
desarrazoando o óbvio
que você batiza de delírio
então eu, alucinada
na apoteose construída
me despeço do direito
— humano, eu diria
histérica, você responderia —
de consentir, de fato
e por pretensa autonomia,
te chamar de
“meu amor”