caio,
temias surgir a mim do pico da minha invenção.
e que a ti obnubilasse com minhas próprias projeções
pretas no branco
e assim amasse de ti o que é meu –
te distorcendo a corporeidade gris de acordo
com meus anseios carências fundamentais,
minha falta de tato, minha tangente vazia
o peso a curvar os ombros e deixar oco o rosto
mas essa névoa quimérica jamais
se demora.
eventualmente eu te culparia pelo luto
de quando desgastadas as fantasias.
tal como fazem os organismos mais pueris
desacreditados da tragédia que precede
o delírio deparar-se com sua
oxidação
– mas mad girl's love song
não seria escrito para você.
em minha defesa,
os teus olhos sempre se preservaram nus
e exigentes que se estripasse a derme
de qualquer ultrarromantismo idealista
portanto soube eu de imediato
e antes de tudo-o-mais
o que eu não encontraria em ti
o que eu não deveria caçar
e os quereres cujo dever vital era a extinção
antes mesmo
de tudo-o-mais
mas eu tenho te aquecido à espessura das noites
– me recusado a adormecer para
te decorar com afinco, em código,
dialeto só nosso, os olhos
irrequietos no REM
e os fugazes espasmos a me balançar também.
e permaneceria por anos
no abrigo dessas horas amputadas –
uma vez maleável você adota essa propriedade
rola para mais que o perto permite,
e requere precipitar sobre meu peito.
vivo para que teu braço me procure
n'algum canto da cama
e me agarre como só se agarra
a condição para existir a noite.
vivo pelo final do dia
quando ao entrar, ainda preservas
destrancado o portão.
vivo para, à meia luz,
conhecer do mais núcleo de ti confissões tuas
que a despeito da vastidão do mundo
somente eu sei.
vivo há milhares de anos para pisar
tuas pegadas a mesma terra que tu.
vivo para ser essa paisagem eletrocutada
extremamente à procura do teu mapa.
vivo porque minhas falanges e meus filamentos sabem
as tuas falanges e os teus filamentos.
você existe em mim como
estive eu no óvulo fecundado, como
a fauna que emerge da putrefação, como
a natureza do pensamento é ser nuvem
nós criaturas cuja conjugação não admite pretérito
nada sabemos de nós a não ser que estamos juntos no sem-nome
sem pés atrás a nos cuidar de ir além
aí fora não restam corpos amantes sedentos prontos a gemer
porque ora tu disseste "espera-me que venho"
(meus dentes ainda rangem ao imaginar)
nós que somos fantasmas fugidos da fronteira das coisas
meu corpo que já não é meu
é aceso. fundente e faz-se em ascensão a ti
e tem minhas palavras te subido à boca
e quando sorvo o hálito compartilhado
entre cada vez menos centímetros
penso que ao teu nome minha voz
nessa cintilância opiácea que treme
cai magnificamente bem.