schize
contra mim
a furiosa serpente intangível
que se enrosca estrangulando as malhas dos corpos
pobres corpos cuja epigenética
versa sobre uma obsessão acetinada –
ele ele ele
pulsando se arrebentando contra o esterno
cento e vinte vezes por minuto a ponto de
ser ouvido do outro extremo de um quarto
– nada mais que faça jus ao dever de viver senão tais olhos
mas a meu favor
quando acata meu devir de animal rastejante
e me convida a ser ainda mais terrível
quando posso dizer que das coisas que prefiro é ele a maior
e ainda assim não assustá-lo, quando
tenho permissão para percorrer
euforicamente o relevo de seu corpo visível
como quem frui da suprema ebulição de uma arte clandestina
contra mim, o bamboleio
de quando decide que não e não
e arranca a si mesmo da minha boca. quando
abruptamente gira nos calcanhares em direção à saída de emergência
e guilhotina o fluxo da dança
justo quando aprendi a mimetizar seus movimentos.
então ateio fogo-fátuo à coreografia já ferida
e engulo as cinzas a seco.
a meu favor a delícia semi-amarga
inefável das noites em que me autoriza a quase gritá-lo
"tu apenas tu
és o início e o fim, e o meio é coisa a ser colonizada
por nós
haverá um dia eu rezo em que muito extenso o meio seremos”
em que encontro licença para não ser cotidiana
“pertenço a ti como se todo o meu sangue de toda a minha vida
fosse comum às tuas artérias, algum deus
foi criado para que tu sejas divino”
e as aspas terminantemente em aberto
e não me censura o verbo carnívoro e não me quer
senão como me apresento imediata
teu nome escarificado escarlate nos meus pulmões –
quando teus olhos os responsáveis por originar os tons verdes azuis
à percepção do cérebro humano
se voltam repletos do que parece ser querer e carência
à autópsia do velo elétrico de um corpo ainda demasiado vivo meu
a causa anima
é haverdes sido parido carregando consigo a própria luz
contra mim
quando me relegas ao escuro e as vozes
que atravessam as paredes da cóclea não são nenhuma tua
e não exiges meu silêncio com os dedos gentis mas antes com as costas dadas
a porta petrificada entreaberta
que crianças-lobo como eu não confiam como passagem
apenas sento e aguardo o próximo ato. leva cinco séculos
e eu ainda tenho a mesma idade.
contra mim também
tua verdade entregue sem hesitação
de que te são correntes outras que não eu
de que teu desejo é um prisma a refratar um arco-íris tenebroso
sobre seios leitosos e uma epiderme incólume homogênea inocente
pelos na maior maciez lisa, silhuetas
mais delgadas onde irrompe e fechas as mãos
quase emaciado de fome voraz
– e com as lágrimas arranhando na garganta eu
certamente me fragmentaria em identidades califônicas
a eclipsarem-me a matriz para que tu gozasses
da adrenalina a ti excitante de quem dispõe de um centro vermelho de aias.
a meu favor,
quando nessa vil intermitência retornas
ainda que seminal seco e
cheio de dedos que omitem onde abandonaram digitais
vestidos de uma textura líquida em teia. decerto
trazendo um dna sórdido sob as unhas.
– mas retornas.
e contra mim,
parecerdes mais satisfeito que antes.