savant
nem mais tão bonito. os traços ordinários como os transeuntes anônimos, irreconhecíveis nos sonhos.
sua vista gradativamente desinteressando, e tem também o desejo agora desértico. sim, porque eu seca invariavelmente. nus, sentamos com as costas coladas — e todo suor é calor da estação. deprimente admitir que aquele toque, ah, aquele toque — virou este toque. que me elicia enjoo.
pra que não me acusem uma cretina, o tempo não faria tão rigorosamente seu trabalho se você não fosse um exímio ajudante. com suas discretas mesquinharias (as quais nunca seriam autodeclaradas sob a pena de uma nódoa no seu ethos forçado de bom-menino), você conquistou com mérito minha repulsa. e eu nem mesmo dei conta de endossar, tão contra-fluxo foi. quando as chispas denunciaram eu me posicionei defensiva, não seria mais que um momento pontual em que as ofensas eram perdoáveis pelo estresse, e em que já conhecíamos o caminho de volta.
mas eu lidava tão mal com esse perdão quanto você lidava bem com a raiva.
absurdo, você diria e sei de cor tua previsão. eu fui tão bom, não errei tão grave, e os outros. e os outros que te comeram antes e o resto é adjacência. eu fui tão bom. depois disso você apela pra minha sensibilidade aberrante — pro que quer que me desautorize e você possa provar, ainda que através do capacitismo, que a razão te pertence. como um bem material irrevogável. eu posso revelar teu pedantismo porque eu sou resultado dele.
você é tão frágil como um dia eu estive doente; lugares-comuns enrijecidos nas paisagens, os discursos inflexivelmente introduzidos por conjunções adversativas. você gagueja e culpa o outro lado. por mais um dos seus privilégios, a sua imbecilidade chega ao mundo revestida de ternura e portanto desafia o discernimento alheio: sou injusta julgando, não vi direito, são meus olhos, desconfie de mim, sou inapta — até que não reste desculpa, mas nesse ponto qualquer um consta meio avariado.
até então só te apresentaram à fraqueza. por isso você é um péssimo trabalho conjunto, fugindo do que é criança e nessa evitação seus planos continuam fantasias inexequíveis. então choraminga as clássicas muletas de mimos, mais um homem mal-feito porque cresce na cauda de qualquer um que se preste a cuidador.
você teoriza até o limite de carácteres sobre tudo aquilo que não concerne teus eventos privados. mas a comunicação íntima é um mistério que não te atrai, talvez porque a mediocridade induz a um estado emocional tranquilo.
e eu quase avancei tão medíocre quanto, quando no início performei uma concórdia dos teus gostos. me especializei nas periferias que te compunham apenas pra me adiantar à verbalização do teu desejo. antes de você pedir, eu já me fazia. eu também tenho parte como reforço, tanto e feio que me moldei, fundindo e massacrando o genuíno, apenas pra me enganar sobre corresponder à tua ideia.
mas até pra mim, vaga e grave, foi impossível mimetizar esse nível de passividade.
também crudelíssimo (mas, dessa vez, insosso de ternura) é o desamparo de quando se esvaiu teu protagonismo. foi de uma percepção parcelada. não morto em batalha ou substituído por um outro centro; apenas recolhido à parte irrisória do cenário.
e no cerne só o canto. não vazio, mas ocupável. como aquilo que não pode ser sozinho e vive à espera. a lacuna que não exige, que perdoa, que abrigaria um exército desses homens.
a tirania do hábito destaca o desamparo a cada recuo teu. é mesmo desafio lógico entender que o corpo a corpo pode ser um isolamento.
e por isso eu tenho de orar que não passa do medo cuidando de não chocar o animal precipitado.