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Mostrando postagens de agosto, 2024

ouço,

ouço  que não é tanto assim, não pode ser trata-se de impressão. eu inventei  o equívoco  por livre escolha  algum homem que não conheço há muito disse  que o modo como sinto era fora da curva  e a história ficou por isso mesmo ouço que careço de resiliência e que conduzo a rotina de modo desenfreado  em desnecessários extremos   e pensamentos polarizados que tenho dever moral de evitar. ouço  sempre sentada do outro lado a uma mesa de distância  que existem formas mais corretas de ser . como se eu não enquanto , mas semeada tal qual joio ouço  que meu passado não precisa ser revisitado que daqui pra frente basta cumprir a cartilha dos marcos comuns. que estou atrasada que eu sou defasada e permaneci lá atrás  pois me foquei em banalidades. ouço  que sou demasiado autocentrada e que lá fora é preciso persuadir a realidade  e me fazer capaz  e me fazer sólida  e me fazer impenetrável  e que isso q...
mergulhadas as mãos através  dos meus dentes rangendo arrombou a escalada profusa entre o ácido  que retorna à garganta foi-se minha úvula e glote e cordas e todas demais estruturas apenas obstáculos no seu caminho e profanou o embrião a nascente  de qualquer palavra. amaldiçoou-as por te afligirem e espelharem para outrem o genocídio  das minhas convicções basais, você  entornou o sentido delas sequer existirem e reclamou cada segundo por nelas estar supostamente exposto e crucificado, elevando contra mim a voz e os punhos, quando jamais ousei versificar seu nome. e foi sobre sua reputação, a consciência coletiva os transeuntes à beira dos teus palcos a perspectiva externalíssima de quase desconhecidos e suas futuras presas em potencial  afinal, o que pensariam eles de você afinal você  um homem de ouro "o cara gente boa de todo rolê" depois foi sobre o que descobriria sobre si mesmo  e de que forma seria capaz de lidar com o próprio reflexo...
coleciono " vai passar " e " basta ter paciência " e " fique calma " – essa sendo a pior coisa a se dizer para alguém em sofrimento – isso já faz 15 anos todos eles a repetir jargões  sempre contidos no privilégio  de estarem do lado de fora  mas nunca ousaram mentir tanto a ponto de dizer  que um dia eu teria  um dia haveria para mim uma vida valiosa coleciono " eu te amo " cuja escavação posterior, falanges carne viva,  revelou espinhas de narcisismo, mentiras  ou apenas enganos circunstanciais  – que eu tenho de perdoar e eufemizar coleciono algozes, então  certeza absoluta  de seus papéis  que hoje se mostram apenas humanos que não me amaram e eu tenho de pronunciar mais uma vez " tudo bem " coleciono culpas maiúsculas   em necessidade  de serem endereçadas apenas a mim, e a mais ninguém  coleciono ser, constantemente, desumanizada  reduzida a um  menos consciente animal arisco e necrófago a roer a própr...
ser obrigada,  por ímpeto de sobrevivência ,  a abrir mão de você é,  na verdade, como fechar os punhos  e me socar repetidamente   mas esse meu rosto  é mais inchado pelo choro eu pensei mesmo que seria capaz de driblar seus maus hábitos  – sempre nos pensamos especiais a ponto de que aquilo não se repita sua boca faz coisas terríveis  suas mãos fazem coisas terríveis  e o seu corpo me odeia   concomitantemente  ao prazer que o meu próprio lhe concede  de adentrar   e revirar tudo eu odeio quem seu ódio me tornou na sua presença. você me leva a limites que eu desconhecia e me torna outra, um alter ego reflexo, oposta aos meus padrões  você me apresenta a agressão  como única forma  de suprir uma necessidade e traz à vida  o pior de mim as juras doces se tornaram gritos acusatórios e os abraços, contenções físicas que machucam seus dedos delicados circundando meus lábios são agora mãos sufocando meus g...
"eu não sou esse monstro  que você descreve",  você diz, em tom de injustiça, e eu me convenço ser sua algoz enquanto você me apunhala  repetidamente – e eu já nem imploro para parar – você me fez entender que eu mereço  como penitência   e não permito à ferida cumprir sua função  de me proteger  pelo contrário, exponho o corpo disponível, no ponto, seja abraço ou um tapa – o que vier de você  você decreta e falar já não posso tampouco escrever e em breve respirar seguirá o mesmo curso   "eu não sou esse monstro", você diz enquanto eu sou esse espelho que te reflete o dobro do seu tamanho "você está cega de raiva", você diz, enquanto eu enxergo muito bem os vários motivos para senti-la "você me fez chegar a isso",  é o que eles dizem logo após espancarem você  e te exilarem da realidade comum e engolimos como uma verdade amarga naturalizadas como despidas de razão   não importa o quê  "me perdoa", eles repetem – não é ar...

ele

é ele no despertar de madrugada, apavorada, vestida de suor – um único travesseiro na cama  é ele  na coluna que range e nos pés que se arrastam  e desistem frente à pia da cozinha  nas mãos sem pressão  já meio deformadas  pelos socos patéticos  ao longo dos anos é ele no pão integral,  no café solúvel  no choro matinal que talvez acorde os vizinhos é ele em cada uma das dez pílulas  – especialmente nos calmantes e no anticoncepcional é ele na esperança ao olhar para as cartelas de sedativos  que escondo com carinho é ele, senhor, nos cacos de vidro no sangue que coagula onde pinga abandonado na cerâmica  pois eu já não ligo é ele, sim, nos cabelos que caem aos montes nos cigarros que fumo à beça  nos textos que jamais virão a público  no mutismo traído apenas pelo grito é ele no imploro da minha fisiologia e eu também não ligo ainda ele nas mensagens que não chegam porque não podem mais chegar mas a cada ligação avu...

domingo

tenho areia nos olhos irremediavelmente baixos. frestas submersas nas olheiras cinzas uma Culpa anônima mastiga sobre o que não sei endereçar. o que fiz eu de Errado ? – eu causei isso eu fui cúmplice  como que pus suas mãos ao redor da minha garganta  e ordenei a esganadura – – sim, fui eu também. – eu preciso pedir perdão   por não ter desvanecido, por ter ousado sustentar   um fio de consciência – minha boca  essa boca, ela mãe da Imundície  Horror  – paralisante e desorientador como um organismo em hipóxia  descrever como “sentimento” não faz jus e não sei identificar nome  ou atribuir porquês  te procurei compulsiva novamente, uma madrugada avulsa e crítica, tentando acionar seus pulmões  pra que eu respirasse apropriadamente  chego mesmo a desejar seu colo rígido  seu tom cada vez mais frio sua risada em zombaria suas mentiras que domesticam seu suor forte após trabalho sua contenção em topografia de abraço  e...