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quão radiante é a arte do desprezo.
ouvir teu nome sem tremer em horror,
e à tua tez não desejar aninhar macio os olhos,
chegando até a rir do mal que foi feito.
diante de ti, ser como se encara um verme
ou forma banal de vida primitiva
que não suscita o ódio ou a revolta
apenas a convicção radical de que
a pequenez, tal como a articulada demência,
também integram o ecossistema.
admitir que, no crime, tornaste muito fácil
o meu desprendimento do afago
e esquecer-me de ti mesmo durante a madrugada,
quando as feras abocanham a própria morada.
fizeste-me imune às fisgadas densas de saudade,
poupando-me até mesmo de almejar
uma realidade menos acre.
a verdade é que tu mesmo arrancaste
o amor que me pulsava o sangue aos membros
ainda que durante o nefasto do ato
tenha-me rompido algumas costelas.
aceito-me esfacelada, labirinto de lesões,
que ainda em tal estado de arquejo e síncope
eleva-se a engolir a tua imagem
como freya banhada em ouro por suas lágrimas.
sou, então, aquela ferida pela besta durante a caça
que a põe assada à mesa quando a noite é vasta.