força bruta
a verdade entrevista
pelas córneas converge desapercebida
e por fim refrata nas más intenções
das quais está cheio o paraíso.
se é tão óbvia inflamação psíquica
a ponto de se tornar piada;
se o vício é um paliativo
que por horas frágeis
(e alguma hipomania)
desfoca da melancolia
se tropeço nos dedos e
apenas por caridade interpretativa
clamo uma frase coerente
você ainda me conduziria
a esse rol vazio
combinados breu e azulejo frio
e entoaria então o passe livre
do sexo casual e do melhor amigo?
(casual é também o perigo)
o habitual despacho
num táxi de madrugada
e quando eu piscasse devagar o bastante
enquanto você fingia o mesmo ritmo
seria divertido
quando esse convidado subitamente despontasse
por trás do teu riso?
foi ainda divertido
quando meu sangue
não impediu teus gemidos?
“isso deve funcionar”
basta me culpar por estar ao alcance.
o habitual despacho
num táxi de madrugada
se tudo que encanta confunde,
e tudo que confunde é segredo,
você garantiria estar doente e sozinho em apelo?
pra que até aí eu me esticasse
em busca de crescer o teu apreço
e me tornasse tua zombaria particular
“princesa,
a ferida
é mais que rima toante
de ser querida”
sob a jura de um revólver apontado
você ameaçaria suicídio se eu fosse embora
impondo seu método de punição quando desagradado?
- e o lençol com sangue seria troféu
apenas enquanto não fosse prova
pois só com reforço punitivo
você concluiria sua tarefa de lesionar o suficiente
para criar a sua mulher-de-verdade
pra que de verdade me moldasse
também aos papéis
de mãe
de princesa
de putinha
de playground
de pornô
a coação é chamada consentimento
tanto quanto estupro é chamado de sexo ou amor.
e insistem que esse sim desavisado perdoa a violência
e insistem que esse sim compulsório
é a tal liberdade sexual -
a menina dos olhos do capitalismo liberal
que manipula através do ideal de empoderamento
consentir sendo a chave
pra por um momento fazer parte
do que eles consideravam juventude e liberdade
e devia a mim mesma relevar
estupidez era doer involuntariamente assim
porque afinal eu era livre
e podia fazer o que quisesse.
(ainda que livre não fosse
pra querer o que queria)
não era estupro
porque não houve grito por socorro
e ainda não era estupro
porque eu caminhei
até o abatedouro
e continuou não sendo estupro
porque era vitimismo.
e nunca admitiram
que confiança e palavras
também são força bruta.