pressa própria da peste,

pressa própria da peste,

é tarde. ainda sou inevitavelmente nova.

no entanto uma traição ao tempo - 

encolhido em seu torso lazarento...

e se ao acaso desponta 

qualquer prenúncio de vitalidade 

a coisa vestida de eu faz questão de esmagá-lo 

sem que um modesto fragma escape.


pois aquilo que de mim se ensaia novo 

não é mais que um casco feito de desgosto

planejando seu irrevogável último ato, 

inebriado de ódio antigo 

- e quantos outros arcos se despedaçaram no caminho... 


esse corpo desde o início um escarrado jazigo,

órfão de vontade e livre-arbítrio,

que continua apenas devido aos pilares de pílulas coloridas 

cujos efeitos periféricos são piores que a originária vida.


e assim ameaçadas as necessidades primárias 

é gestado esse impulso 

em direção às coisas precárias,


(sabe, quando o próprio medo 

desova excessiva consciência 

do próprio medo

de tudo aquilo que é próprio)


e a crítica invertebrada se torce 

exatamente contra aquela que critica.


(saiba. é o suor que tece a fronte) 


anos de cativeiros-consultórios dos mais variados intestinos 

onde por detrás das mesas consta 

um homogêneo exército masculino

cúmplice de um mesmo plano normativo que diviniza os modos contidos

e me garante ainda aos dez 

que não sou aquilo que acordaram como típico 

e que pelo resto das décadas devo me empenhar no trabalho

de consertar do meu pessoal ao neuroquímico.


pois só assim 

as bulevares permitiriam, sem ressalvas, minha correria

e as vontades alheias seriam - dessa vez de verdade

também as minhas.


nessa obsessão cáustica por performar a calma,

os dias comuns se convertem em compromisso exaustivo 

de bradar contra a tendência natural

e vez frequente um outro rótulo atualiza 

meu epíteto de decepção moral.


percebo humilhada

que todos os lugares de agora me parecem 

uma sucursal da antiga ala psiquiátrica. 

e que depois de arranhar a garganta eu ainda 

ergo a língua 

sob a sina de inspeção rápida.


a via crucis das memórias cava 

para fora da ilusão de segurança. ressuscitam os eventos que jurava exorcizados 

e os milhares de “sinto muito” em mantra.


então pululam novamente nítidos 

e ainda quentes 

os rostos cerrados em feridas...

na insolúvel dinâmica em que não me podem ouvir, 

e eu não lhes posso alcançar.

os tais rostos que não guardei nas mãos em concha. 

e finalmente o meu rosto. que é impossível mais odiar.


conheço bem essa fila indiana de especialistas austeros e impessoais, 

cujas posturas reiteram que não têm nada a ver com isso;

sou a paciente das quartas e sextas, CID 60.3, 560 reais mensais, 

e de prognóstico demasiado negativo.

única constante é a tarefa incessante de 

recontar as trajetórias feitas de preto-e-branco

e em preto-e-branco supor o bingo de porquês;


talvez uma deficiência congênita do receptor de serotonina 

ou uma lesão orgânica no lobo temporal.

talvez a amígdala menor e hiperativa 

conjunta à má hora, ao mau jeito e ao desastre natural.

também a mãe desgastada de ser heroína. 

e o pai não mais que uma história mal contada

sobre todas uma só - bastarda puta louca e por fim uma cobaia.


e o estupro 

que sempre altera seu nome civil - 

até se tornar um crivo alheio. 


pra que eu possa suportar a inevitabilidade do azar

e a impotência diante do acaso.


(é o que é)


nesse ínterim só sou livre

pra perseguir a ideia de apego 

como um bálsamo de cura imediata

que não atravessa a essência das lesões 

por carências extremas disfarçadas.


pra insistir nas buscas por ele - 

esse homem que não me quis ceder os genes 

mas o fez 

apenas por deslize 


e pra colecionar as esmolas 

até fiascos levemente parecidos 

com uma fantasia comungada de unidade familiar. 


e pra castigar 

que o trivial se agradece através do corpo, 

dever sempre dormente e atuado, uma vez que sobre o corpo se aprendeu apenas 

pela traição e pelo asco


até que os sonhos pela integração, 

em mormentes choques e espasmos,

sejam justamente aqueles que corrompem 

os sonhos -

até que eles por si só suicidem

no interior dos caríssimos frascos.

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