maniac pixie girl

tem sido divertido?

enquanto enceno o estereótipo bonitinho


é uma graça mesmo a aparição moderada.

como um filhote de um predador que, ainda frágil, permite manuseio


eu ainda macia e maleável...

te interesso. 


(isso você quer pegar

isso você quer comer

isso você pode digerir)


e você se sente muito bom por isso, certo?

muito importante e indispensável -

é combustível de ego simular esse papel de cuidador


até que a piada se engasga na garganta. e a performance é grave - 

as fronteiras contendoras e higienistas se dissolvem em ácido 

e embora eu tenha avisado

(porque tem de haver uma prévia advertência sobre aproximações)

você age como se tivesse sido enganado. e passa a me fitar desbotado

exatamente como se encara aquilo que perde o querer 


mas ainda é curioso... 

um animalzinho exótico 

e contanto que haja certa distância você pode atiçar com objetos cortantes


e brincar de ter razão 

treinar sua lábia

lagar ao léu a desonestidade 

basta uma cobaia. e ninguém olhando

afinal, que moral?


ninguém olhando


basta dizer que é mentira


que eu absolutamente não entendi nada

basta garantir que eu reajo distorcidamente

que eu sou péssima interpretadora 

que são meus humores e meus hormônios e meus neurotransmissores 

que é minha dissociação minha despersonalização meu delírio e todos os outros sintomas que você não se preocupa em conhecer e inscreve no trato eufemista

que é minha deficiência de sono, minha alimentação desregrada, minha rotina sobrecarregada, minha falta de exercício 

que é meu sangue meu gene meu diabo a quatro 


todas as desculpas 

todas as justificativas mais específicas e reducionistas

todos os modos de deslizar e se esquivar e se abster de qualquer compromisso um dia declarado 


você diz que o que eu digo é expressão de qualquer outra coisa

e que eu não opero com livre-arbítrio 


que não é verdade o ferimento

e que eu criei isso também 


isso tudo porque você viu num vídeo ou leu num paper online de autoria de um macho branco neurotípico qualquer 

isso tudo porque você instrumentaliza a teoria a favor da sua ignorância voluntária 

e transforma em outra das mil e uma fábulas sobre como uma mulher pode ser louca e burra


nossa mas você sabe tanto

você é extraordinário 


construto tóxico de homem acadêmico 

que manipula todo conhecimento pra solidificar as bases da violência muito disfarçada e sutil 


nossa mas você sabe tanto 

sobre absolutamente nada

e de nada valem tuas mais renomadas referências

e seu apego com os estudos de caso de participantes anônimos 

tão anônimos e tão alheios


mais de babacas austeros e aristocratas empilhando livros na prateleira e envelhecendo em torres de marfim 

mais de meninos mimados com acesso indiscriminado a micropoderes.


todo o seu diálogo uma tentativa de explicar a mim mesma como sou e como ajo

até que eu sobretudo desconfie do meu próprio julgamento

e continue seu trabalho pelas minhas mãos 


e quando eu buscar fôlego no autoflagelo aprendido 

você tem enfim a liberdade de jurar que eu enlouqueci de vez e que dessa vez fui longe demais

e que você não precisa se sujeitar a isso que você não pode lidar com isso

e que nunca esteve tão assustado


vai colecionando meus pedidos de perdão como entulho


então me dispende as condições 

e eu retorno ao engenho cortando aqui mutilando ali incinerando o excesso 


seu segredo sádico

sua maniac pixie girl

de loucurinhas adoráveis 

à coleira e aos espinhos 

ao escuro


e agora? 

eu pareço querida outra vez?


e assim 

e então 

eu tenho me feito exatamente

tão patética e fodida quanto você 

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