antônimo de tal
"felicidade" em uníssono.
eu digo “vitalidade”
há 3 ou 4 meses levantava com vontade. abraçava quente minha mãe, bom dia. sentava à mesa tagarela, me arrumava sem pensar em mais que aquele agora exigia. saía em passos rápidos, ágeis, figurando o vívido de uma criatura. pegava o coletivo sem me perturbar com grandes questionamentos. assistia às aulas cheia de anotações, interagia com facilidade e gosto - as trocas eram fluidas. entrevia a denúncia de pôr-do-sol pelas janelas de algum bloco daquela federal, que pela primeira vez me parecia apenas mistura dos blocos velhos e muita cor de gentes, ao invés de um bosque de guerra interna que me instigava taquicardia e enjôo assim que atravessava um limiar. as coisas ao redor eram apenas elas mesmas, sem qualquer teor adicional de perigo ou mágoa iminente. eu mal recordava aquela outra, bicho em eterno modo de defesa, cheio de raiva e por baixo da raiva o medo e por baixo do medo o vazio melancólico inextirpável. eu mal lembrava o que era o crônico.
no início uma irritabilidade, assim indefinida (e deveras clássica) e por isso tudo tão estúpido e sem sentido, inclusive eu; então a culpa incógnita, e minha estabilidade dentre-dois ou mais vacilava. contato se assemelhava a processo complicado, puro de poréns. então voltei com a desgraça das inferências: quando assustada, tudo ao redor como sinal ou indício, e de repente brota um quê de desprezo na expressão neutra, ou um tom de hostilidade nos comentários banais.
mas eu ainda me levantava cheia de vontade, me movimentava de um canto a outro da cidade tranquilamente, me regozijava de uma funcionalidade jamais testemunhada; me encaixava nos ambientes, atuava diretamente, realizava as obrigações lá fora e em casa, dormi por várias semanas naturalmente ou com dose bem menor da medicação. comparecia à terapia, exercitava as ferramentas e a cada consulta no psiquiatra um novo elogio encorajador. conseguimos, ele dizia. você está estável. pensa e age por si mesma e a tendência é progredir. logo a gente desmama os outros remédios e você fica só com o antidepressivo.
e então...
cada vez mais fraca
emboto grave, desaparecendo -
arrasto os pés (mais um pouco e haveria faíscas) e os movimentos são travados e lentos. custo a reagir aos estímulos, a atenção é precária, o sono não vem se não houver um indutor sintético.
como um camundongo sem nome outra vez na caixinha, cobaia drogada de experimentos antigos.
isolei por perto as cartelas porque é inútil decorar os nomes e contar os diários na mão; posso requerer mais ou posso apenas recorrer: antes me comprazia estar mais sóbria que nunca, agora reticências e um roxo emergencial deve pausar o raciocínio embolado.
meia hora depois e não lembro o último pensamento inteligível que tive.
pisco devagar, mas não é sono.
a pupila já desenterra dilatada.
volto a ser uma estranha sempre deitada, pouco interativa ou cooperativa, no pois de toda essa lerdeza e desânimo. as sensações precisam atravessar uma carapaça translúcida e chegam aos fragmas, às doses, mortificadas. são insuficientes pra encabeçar qualquer revolução. uma crise econômica de verbo
foi num domingo que a vi outra vez; não transitiva mas íntegra na raiva e na barbaridade. sem cumprimentos. nem me atrevi ao nome. era apenas uma outra ela sobre o eu, a cara vadia e odiosa muito antiga, suada e suja e os traços contorcidos o rosso pulsando à mostra como um sobre-tudo, de tão desmascarada e transvestida. peste.
soquei o espelho e rejeitei só no volitivo a delícia que era o tragicômico combo de choro livre, nós dos dedos abertos, cacos formando o quebra-cabeça do reflexo. e a gota sem esperar romper cordão umbilical da gota anterior, vermelho vertendo a coisa mais linda, o vidro e o vermelho tão estéticos, a humilde poça corrente sendo assistida até consistência de nata, aquela maldita membrana interrompendo o fluxo-floema. eu tagarelava aos líquidos, enfim. era injusta a fugacidade e numa próxima, que certamente haveria, eu doparia o tempo. afiaria e afundaria só um pouco mais, exata o bastante na anatomia ante veias.
o timbre de quando algo se parte
e minha mãe corre ao quarto apenas pra levar imediatamente a mão ao peito. mas dessa vez eu ainda difiro um pouco, porque cato e junto o que fiz, sem berro algum, sem desculpas.
migro de buraco a outro da casa sem qualquer interesse. sem-lugar, aos abrigos, pesando um corpo abaixo, só um contorno borrado e subalterno. coadjuvante e narradora observadora. às tantas terceiras pessoas.
e claro que me ressurge um outro familiar par de olheiras e tez de queima empalidecida além e longe da minha, volto ao você-etéreo, pós jura de nunca mais. e novamente não basta a imagem, eu sonho em ficar outra vez na ponta dos pés e te trançar os varios fios negríssimos, sigo inalando as esmolas
acho até que se fuçar muito acho aqui umas células mortas
e essa que re-volta não pode mudar em química e não quer esquecer a realeza do arranhão
perdão-nenhum perdão-nenhum
desde que se foram os conectivos de pele e o todo-mais da carne eu só sou capaz de frases suspensas
entenda que desconheço os dêiticos uma vez mais como sempre
e supera a extinção fenomenológica minhas tantas espécies de supergeneralismos infectos
entenda que sem vírus eu já mal respiro