superlativa
a condição é passividade.
a lei é agonizar
sem barulho.
sem cena
sem drama.
eu ainda era quase criança
à primeira vez que depilei as pernas
e foi sempre quase criança
que era forçada a deixar de ser.
aos sete, descobri que a repreensão
recairia sobre quem usava a saia
ao invés de sobre quem se esforçava
para espiar o entremeio das coxas
antes mesmo do estirão,
marcas de quedas e pancadas,
calcinhas estampadas de algodão...
desde então não amarro os cadarços
de qualquer maneira.
calculadamente me abaixo,
num cantinho estratégico e encolhendo os quadris
- toda sutileza para não provocar as bestas.
toda atenção para não cometer o pecado
de deixar juntar as sobrancelhas
ou usar apenas uma blusa
quando o tecido passa a revelar
as mamas apontando entre a gordura
- mas a condição é
passividade.
relevar os comentários
relevar os cemitérios
fingir que não fere
engolir a seco
suar medo em cada poro
repelir o próprio ódio.
sou violenta
na legítima defesa
nossa fiel companheira
mas o que eles querem da gente
é apenas paciência.
as tochas de mil e seiscentos
brilhando nas telas dos smartphones.
estamos exaustas e feridas,
a maioria, mortas,
mas sobretudo, putas -
e apaixonadas pela nossa ira.