poor thing
ainda é manhã cedo
-- até a Angústia ainda dorme --
quando ela me procura
para disputar um homem
(do qual eu já não faço nem questão)
ela o quer a todo custo
mesmo que pra isso
tenha que agredir outra mulher
gratuitamente
tendo conhecimento prévio de seu estado fragilizado
arriscando uma vida pela posse de um macho --
como um objeto de prazer que foi roubado --
apenas pela delícia que é pôr em prática a barbárie
quanto se é inábil diante da mágoa
apenas mais uma presa que anseia ser dilacerada pelo próprio predador.
é preciso lembrar que, no fim,
é só um homem.
sim, essa é uma sentença completa.
ela narra pelos dedos
como quem desenha a adaga
detalhes explícitos que não exigi
como o sexo era interminável e maravilhoso
como ele facilmente ficava duro perto dela
(amiga, a dureza dos homens
não é tão rara ou fascinante assim
basta chacoalhar o pote de ração
não acho que você deveria comemorar isso)
amiga, em trinta dias
você fez desse homem tudo isso pra você?
recomendo que você cuide urgente
da sua autoestima
porque sabemos que fora o que você inventou
ele não é tanto assim
trair consciência de gênero
regozijando-se com a dor de uma mulher já estraçalhada
estar tão sedenta pela validação masculina
traduz uma significante lacuna identitária
-- poor thing.
você floreia os versos para me atacar
mas eu não nutro ódio por você.
é o que você quer, porque é mais uma
doutrinada em escola primária de rivalidade feminina
que reproduz a violência por tê-la naturalizada
e vai se referir a mim como vagabunda na mesa de bar
entre pessoas que compartilham
a mesma carência intelectual.
então, o que me salta é dó.
mulher nenhuma deveria
ser exposta a condições de vida tão limitantes
a ponto de desviar o foco do real responsável pelo erro
para revitimizar uma companheira
é lamentável que você rosne para mim
enquanto para ele sorri
sendo que foi ele aquele que nos mordeu
rasgando a carne para nos comer
apenas por satisfação.
é lamentável que a sua raiva
seja motivada por não ser a primeira opção de um homem qualquer.
porque eu quero mulheres furiosas --
mas sim pela apropriação dos seus corpos por uma hegemonia masculina.
é lamentável que a sua fala
tenha como intenção me trazer desconforto
porque eu quero mulheres usando de comunicação assertiva
exaustivamente
quando seus direitos são ameaçados.
é lamentável que você não tenha recursos para entender que sororidade
não significa receber tapinhas nas costas de forma compulsória
apenas por ser outra vítima (que não se reconhece como tal
porque prefere ser a mulher eleita como
funcionária do mês)
porque eu quero mulheres seguras de si e capazes de oferecer consequências aversivas
diante de comportamentos condenáveis.
amiga, prover esse status a um homem será
seu declínio como mulher.
escreva minhas palavras
melhor do que você as lê
como se um cristalizado repertório masculino
fosse rachar e não se generalizar também com você,
eu estaria constrangida de residir sob sua pele
e me apequenar tanto para caber
na ereção de um cara aleatório.
mas eu honestamente não esperava dele
algo diferente de alguém como você