[tenho passado a odiar as noites]

tenho passado a odiar as noites
porque até elas também são tuas 
é quando está você vadio no meio do mundo
a me magoar
com toda essa vivacidade, esse apesar-de,
esses desejos frívolos
-- sei do que eles são capazes --

corpos
é tudo no que você pensa, corpos
é tudo no que eu penso que você pensa
eu adivinho eu quase 
delírio, um continuum
eu te acho nas plataformas
procuro o cabelo vasto num coque
checo o portão, procurando
nem que seja uma sombra
eu te suponho nas praças 
eu peço a Deus que lá esteja -- e eu não creio
em nenhum de vocês dois.

mas eu passo pelos marcos 
esperando um esbarrão "desproposital"
que não escancare minha intenção prévia
meus planos perversos
de ter um pedacinho só a mais --
e aí eu me dou conta da mendicância,
e em que ponto você me fez chegar.
ou talvez eu sempre tenha estado exatamente aqui
foi aqui que você me encontrou
e foi aqui que você me deixou
-- em casa 

eu posso ver vocês 
durante a palestra no auditório 
na fila para entrar no ônibus 
ao atravessar a rua fora da faixa 
jogando o corpo na água gelada
na metade do comprimido na caixinha
nas anotações avulsas do bloco
na renda secreta da minha calcinha
eu posso ver vocês às minúcias 
eu posso ver como foi que aquela marca ficou em você 
(e eu não fiquei. eu jamais
sobretudo eu não estava ali
como que nunca existi)

eu quero dizer que isso não é uma corrida
e mais à frente não vai importar quem fez o quê primeiro
eu quero dizer que a sua pressa não significa nada superior
mas eu choro como os bebês, quando lhes falta fôlego 
e eles ficam alguns segundos em silêncio, 
com as bocas abertas
até liberar outra vez o berro
e me contorço na cama, sem encontrar asilo,
com as mãos no peito tentando conter aquilo
enquanto você -- bem, nós 
já sabemos sobre você 
e que você apenas
não --

por puro consenso terapêutico
e pra amenizar o prejuízo 
eu me esforço para extinguir seu repertório de me buscar.
porque sei que não parte de amor,
embora você use essa palavra porque pretende efeito de resposta
não, você não sabe sobre amor,
e sua procura é egoísta. você apenas se sente um pouco desorientado,
então aciona uma mão familiar
e é isso.
ainda assim, saber não basta frente à emoção,
é como atear fogo numa biblioteca,
pois aguardo o dia inteiro uma tentativa sua 
de entrar em contato. e quase me alegro
quando você despende um pouco mais de energia para isso.
veja bem o meu nível de -- 
e eu queria te ligar agora mesmo,
mas é provável que eu ouvisse a voz de uma mulher do outro lado
porque agora sou eu 
a mulher da margem oposta.

eu contenho o aceno
porque não é pra mim que você olha

e eu queria aprender a agir assim,
impiedosa



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