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Mostrando postagens de 2024

whore

é bem verdade que só o teu rosto o teu rosto sangra a minha lágrima que flameja um transplante. assim deitados com as testas encostadas na presença da minha melancolia familiar mereceria a cena uma pintura medieval sobre o demônio do meio-dia que não pressiona o peito, pois mais abaixo em ti quem o faz sou só eu . tuas algumas palavras que me soam perigos também guardam  essa firme dureza na voz para afugentar a bizarra fauna que desponta amontoada dos lares do meu desassogego e que esbraveja para te tocar. prova disso é quando me movo sutilmente e há  orgásmicas fincadas nas costas onde tuas mordidas fizeram auréolas  e meu grito contrariado suicida-se porque decepciona a própria natureza da dor. assim deitados com as testas encostadas eu percebo que tuas pálpebras dispersam uma fragrância do que é recém-nascido puro virgem os teus cílios são asas de ágeis gaivotas que indicam terra. as minhas lágrimas encontram foz nas tuas maçãs  que enrubescem à menor variação d...

schize

contra mim a furiosa serpente intangível  que se enrosca estrangulando as malhas dos corpos pobres corpos cuja epigenética versa sobre uma obsessão acetinada – ele ele ele pulsando se arrebentando contra o esterno cento e vinte vezes por minuto a ponto de ser ouvido do outro extremo de um quarto – nada mais que faça jus ao dever de viver senão tais olhos mas a meu favor  quando acata meu devir de animal rastejante e me convida a ser ainda mais terrível  quando posso dizer que das coisas que prefiro é ele a maior e ainda assim não assustá-lo, quando  tenho permissão para percorrer euforicamente o relevo de seu corpo visível  como quem frui da suprema ebulição de uma arte clandestina  contra mim, o bamboleio de quando decide que não e não  e arranca a si mesmo da minha boca. quando  abruptamente gira nos calcanhares em direção à saída de emergência  e guilhotina o fluxo da dança justo quando aprendi a mimetizar seus movimentos. então ateio fog...

quase

eu quase chego na hora exata de ser uma escolha uma escolha anunciável - estive a três corpos de distância,  talvez  pulso tão perto do teu peito a ponto de vibrar também as marteladas o teu caminho por pouco não esteve entrelaçado à minha febril marcha. a tua vida por pouco não esteve pronta a me comportar. propositalmente,  mantenho fora a metade do corpo mais acidentada. eu discurso de sobre uma muralha, recolhendo os membros que pecam a dependurar-se às vezes. - diz da urgência biológica minha pela queda - monarca de uma faixa íngreme de terra  sob ameaça de ser aniquilada do mapa  caso eu ultrapasse um pé que seja ao acordo - ainda que tu mesmo me convides para depois jurar uma miragem. à noite eu quase sou nativa   do teu berço. logo em seguida, tua língua à minha é quase  materna. quando estupidificada me iludo que o cessar-fogo é um excerto de tempo seguro para habitar tua terra. mas então, como de praxe,  sombra aveludada que busca ate...

caio,

temias surgir a mim do pico da minha invenção .  e que a ti obnubilasse com minhas próprias projeções  pretas no branco e assim amasse de ti o que é meu – te distorcendo a corporeidade gris de acordo  com meus anseios carências fundamentais, minha falta de tato, minha tangente vazia  o peso a curvar os ombros e deixar oco o rosto mas essa névoa quimérica jamais  se demora. eventualmente eu te culparia pelo luto de quando desgastadas as fantasias. tal como fazem os organismos mais pueris desacreditados da tragédia que precede  o delírio deparar-se com sua oxidação  – mas mad girl's love song não seria escrito para você. em minha defesa, os teus olhos sempre se preservaram nus  e exigentes que se estripasse a derme de qualquer ultrarromantismo idealista portanto soube eu de imediato  e antes de tudo-o-mais o que eu não encontraria em ti o que eu não deveria caçar  e os quereres cujo dever vital era a extinção  antes mesmo de tudo-o-m...
teu suor me batizasse, tua semente me ungisse. e no abismo da faringe, transbordasse meu calar . à sinestesia de uma cerimônia, inalo tua testa, duma fragrância metafísica  cujos captadores só desenvolvem aqueles destinados a amar violentamente.  trisco os lábios nos teus cílios  tremem, tímidos, teus olhos fechados. temendo te acordar, te acaricio com dedos feitos de pena. teu ressonar enrubescido é meu ruído branco. balbucia um euteamo e não sei se você recorda mesmo quem está ali. inconsciente, arremessa braços pernas   na inteireza semi obscena do instante em que, envolta pela tua carne, respirando abafado quase entre tuas vísceras, estivesse eu em um casulo de ti. ao teu redor, o mundo é um detalhe ossudo  e pontiagudo  do ofício. eu mariposa medíocre em sua filogênese amaldiçoada  de espiralar rumo à aniquilação na luz carmesim que só você emite  ao final do meu túnel. cumpro minha curtíssima vida de tentar te alcançar. anseio dizer sou...

é assim que te olho

não houvesse colonização sobre a terra ou vestígio a esmo de vida inteligente  civilizações inteiras padecessem soterradas mas, antes, uma única silhueta – em seus ombros largos e invulneráveis ao grande silêncio do universo –, que me dita a natureza do próprio gene. – é assim que eu te olho. sou capaz até mesmo de esquecer  o que fazem os homens . e te fitar como uma espécie à parte que volta e meia, um acidente, mimetiza um gesto ou outro  dos seus antepassados. cresceram teus olhos voltados para dentro . e aquilo que sujo vês, que pensas indigno e pecha merecido converter-se em segredo – isso também de ti eu quero. tornar-me então uma visitante assídua do que você mantém entre grades estender a mão aos teus lobos receber no colo teu corpo de guerra seja encardido seja profano, trilha seca de sangue arcaico, feridas a flux destinadas à infecção,  os calos nas mãos ásperas como ímãs ao próprio pescoço – misturar-me à sepse como a mulher que não se curva à morte q...

ss

quão radiante é a arte do desprezo . ouvir teu nome sem tremer em horror, e à tua tez não desejar aninhar macio os olhos, chegando até a rir do mal que foi feito. diante de ti, ser como se encara um verme ou forma banal de vida primitiva que não suscita o ódio ou a revolta apenas a convicção radical de que  a pequenez, tal como a articulada demência, também integram o ecossistema. admitir que, no crime, tornaste muito fácil o meu desprendimento do afago e esquecer-me de ti mesmo durante a madrugada, quando as feras abocanham a própria morada. fizeste-me imune às fisgadas densas de saudade, poupando-me até mesmo de almejar uma realidade menos acre. a verdade é que tu mesmo arrancaste o amor que me pulsava o sangue aos membros ainda que durante o nefasto do ato tenha-me rompido algumas costelas. aceito-me esfacelada, labirinto de lesões, que ainda em tal estado de arquejo e síncope  eleva-se a engolir a tua imagem como freya banhada em ouro por suas lágrimas. sou, então, aquela...

ridículo

ridículo é sobre ti escrever  ainda de pé e desnudada diante de, transbordante os arrepios na espinha, ré da tua confissão sobre um afeto embotado . e, quanto a isso, não te abordarei. jogo sobre os ombros meu manto de espinhos para te absolver de qualquer gérmen de ideia de dever para comigo. ridícula é tal euforia elétrica que me percorre e eriça os pelos mais ocultos  quando tua imagem estática, estéril, me aguarda frente ao portão. esqueço. o automático da respiração  esqueço. como se modulam os músculos das pernas para caminhar – e só conheço como usá-las  emaranhadas  ao redor da tua cintura. ridícula é minha alegria, doença autoimune, quanto ao teu fugaz e volátil e de soslaio olhar quando em ti estou  montada  (e desvendando, honrada, o mover meu que mais te apraz) rezando para que não tão veloz ele se dissipe e que algo dessa vista te agrade e, mais ridícula, convenço a mim, murmúrio ao pé da minha orelha, de que são provas suficientes micr...
venho esquecida de mim enquanto a flux, venho esquecida  restam, para me guiar, apenas contos populares, demasiadamente orais – com seus deslizes interrupções  e vícios de linguagem – daqueles que tangente riscaram,  daqueles que evadiram, aos apressados tropeços, do horizonte decrépito e ermo, da terra arrasada por uma guerra particular. os papéis de parede outrora delicados jazem descascados entre perfurações na alvenaria  de socos e chutes de quem quer ardentemente romper o acordo com a realidade e obliterar as trincheiras que construíram o presente. pequeninos feixes paralelos na estrutura,  são filhos de unhas roídas  gritando ao material alguma tirania do hábito. espelhos estilhaçados propositalmente, cujas molduras se mantêm  intactas. e suspensas  e as provas de vidro que não foram recolhidas, testemunhas do que se sucede ao pronunciar três vezes o próprio nome mediante reflexo. não havia como ver a mim.  em verdadeira forma, despid...
espero um pouco mais... deixa a voz ausente  sanar de sussurrar e os olhos se fazerem menos verdes. e minha mão adormecer da sensação  de deslizar sem nós pelo cabelo  rente à nuca recém cortado imaginei que eu o acompanharia crescer nos segundos que  sobre mim  você sorria e a realidade desandava, retorcida deixa que eu me assuma ré  por bramir o corpo demasiado atônito de  um sentir hiperativo, até mesmo estupendo e estúpido ; e por uma cabeça tão rígida que não decodifica o alheio como lógico, deitando-se a dormir sob a guilhotina miserável de nuances, só processa ou o incendiário ou o que foi reduzido a cinzas e qualquer outra vida do calor é mistério incognoscível  de modo que nunca nos sentaríamos ao redor de uma fogueira nem acenderíamos uma vela de aniversário  deixa que eu me ressinta  pela minha natureza de fugir antes da ordem de expulsão, de me empurrar ao pólo contrário onde ansiava enraizar o meu afeto. precavendo não me t...

do not resuscitate

os bilhetes nos bolsos  ou sobre móveis  são feitos de trivialidades e burocracias. não há nada romântico, poético ou estético dígitos de um documento,  números de telefone “não entre no quarto, não deixe que ele veja transfira meu dinheiro para sua conta no banco em caso de parada cardiorrespiratória, favor não ressuscitar doem os órgãos funcionais de resto, opto pela cremação  eu amo você como o que faço agora parece dizer o contrário  perdoem pela bagunça e pelo incômodo” perambulando pelo labirinto de metal com um acesso fincado na veia exigiram um familiar ou alguém que autorizasse minha saída  e tive a expressão órfã das mulheres que não têm quem as leve para casa que não têm nem mesmo casa e essa veia conectada  traduz o silêncio  e a solidão que precede o auto extermínio em massa  a evidência sucessivamente reiterada  de que não há viv’alma a comunicar antes que esteja feito eu quis te ligar, ainda que relutante, mas, com certo e...
mastiguei a expressão proibida pensando que bom que estou sóbria  e que trágico  que algo tão nobre, pra ti, se vista de exigência  salpiquei de beijos as tuas sardas nos ombros  achei que seria o suficiente para você perceber  não se beija assim  com tanto cuidado e deferência  as sardas nos ombros de alguém provavelmente já sabia, sim e fingia que não para se manter em segurança  era óbvio para qualquer um que me olhasse ao teu redor, óbvio como o que não carece de ser dito, mas continuamente é, por trás dos lábios  que se sepultam em carícias  por toda a extensão do teu rosto comove-me o menor dos gestos  que comunique uma nascente morna de afeto havia música estridente mas a casa calou enquanto eu te contemplava absorvido precisava lamber teu suor fino levemente salgado  precisava beijar solenemente  centímetros impopulares de ti precisava me sublimar  na tua sombra precisava estar descalça  sobre teu chã...
"não deveria ser assim" – apesar de tal certeza, é como  se o mundo risse  à beça   através do trânsito  do trabalho da natureza do metabolismo da tua habilidade indiscutível de desejar alteridades ao continuarem, todos eles, a despeito – teu olhar-umbral onde eu espectrava a colher ervas daninhas floreadas de espinhos e fazê-las enfeites  mas são inocentes as horas e ainda que pareça imperdoável  nada me deve a vida no entanto, procuro  na expressão dessa gente toda  um traço que seja que ressoe  com o meu Desespero dissimulado com a minha Solidão abarrotada e possa eu me encontrar pertencente por um ínfimo momento e você também continua,  capaz e apressado, bebe e fode e ri tanto quanto  qualquer um porque não me deve nada não há a quem me queixar – é o que é  mas não deveria ser não me cabe exigir  meus quereres um dia distante eu drenaria meu sangue para que teus órgãos  cumprissem suas funções   com e...
quase lambi   num hábito fosco os mamilos do homem acima de mim e aquela ali, amanhecendo escura na cama de um estranho, é uma versão minha que  você tinha curado   as línguas apenas avulsas se desencontrando  num ponto crítico  – sem retorno e as mãos de um outro que  gentilmente me acariciavam,  eu interrompi para checar que não havia os músculos  que as suas cultivaram de tanto tocar algo que não sou mais eu agora me disperso tão podre  quanto você  enfim compatíveis, podemos disputar pecados hediondos até que empoeirem me pergunto como é possível  sobreviver qualquer desejo pelo alheio logo após conhecer o Amor por alguém  – sobreviver – – coisa essa em que só você  é perito sempre espero te encontrar  escorado às portas dos ambientes  em inanição do abraço não ensaiado no interior de onde se dissolveria o mundo a playlist no modo aleatório trouxe aquela banda dos anos 80 que você adora e eu apertei os olh...

20 de setembro

criaste o luto do abrupto feito muro  que se ergue perante um veículo que tu mesmo empurraste. e usa de toda tua força bruta para findar a si mesmo. eu, como teu câncer  também senti a extinção. mas vives tu, ainda. no desalinho nos micro objetivos voláteis  que despontem qualquer raso gozo. não carece de muita burocracia - uma lisa sombra feminina que se estenda sobre a tua cicatriz e pergunte sobre ela. já te basta. inventaste o luto da costela. e eu o gestei ectópico. pari sozinha, às margens dos teus supercílios não pude segurá-lo ou dar-lhe o peito pois o luto é uma existência  que se nina com os braços vazios. saíste deixando sob meus cuidados a incerteza fúlvia de um retorno futuro. deste desculpas incognoscíveis, me obrigando a elas decodificar  como prova cabal de amor. não me convidou  para o centro da festa. chamaste outra a pôr  os pés sobre os teus e não te sobressaltou  a forma diferente por onde deslizavam  tuas mãos. era a lou...

4 meses

a mão que se ergue em ameaça coreografada é a mesma que guarda bem apertado o fóssil  daquele afago tão familiar  o abraço que esmaga o órgão pretendendo agir tal qual uma camisa de força enquanto eu me debato em ânsia  do curso trivial do metabolismo é o mesmo que tantas vezes  me aninhou meu próprio cárcere  os olhos que me alvejam ora querendo me ver queimar, ora querendo nem me ver, e que erotizam em desejo alguma transeunte fanática  tangente ao palco ainda são aqueles – a gênese da tragédia  que se deitavam tão macios sobre a minha imagem  de menina travessa a voz que invade os cômodos  que faz tremer a postura mais digna ainda guarda semelhança  com a que jurava vidas eu inventei você como se faz uma quimera no deserto ou um personagem que salva os menos favorecidos  – as pobres garotas problemáticas  e tudo o que eu mais amo não passam de flashes mnemônicos seletivos era cada vez mais raro você  parecer ainda consi...

Armillaria ostoyae

I não entendi até que a delegada disse, o sutil não é pequeno,  mas é aquilo que reitera-se bem camuflado. e se estende discretamente desapercebido subestimado como os micélios de um cogumelo-do-mel. foi preciso, logo a mim, uma veterana , decompor e operacionalizar o que era violência  é assim que se aniquila alguém  sob o sol do meio dia, em meio à multidão, e ainda se ganha  um tapinha nas costas e coxas abertas sedentas em self service. II no início, sempre reluz.  um efeito tão estroboscópico que  cega .  e por cegar se ignora sinais, como vermes  microscópicos fazendo  o que nasceram pra fazer. ser posse às vezes parece que também se está fazendo o que se nasceu pra fazer  acumula-se absurdos até que  a metástase deles  define o cotidiano. e então  o estado de desorientação crônica feito pano de fundo do dia mais ordinário, uma nova natureza. sim, eu me deixei ser inventada   à tua imagem. te nomeei o maest...

sobre

"não é real", eu pensava enquanto você pressionava mais a mão sobre minha boca e o peso do seu corpo me afundava no colchão  você diz que  só quis calar meus gritos mas eu também não conseguia respirar  – coincidência, você dirá  não estou aqui, esse sobre mim não é você  (e você repete que isso não é sobre mim) não sou eu ali esse deitado sobre elas, transpirando, não é você  suspeito que algum desses corpos seja o meu  catatônico e tentando  desacordar  os outros estão bem despertos e se movem freneticamente  tesos enquanto eu amoleci os membros em asfixia até que você se satisfez e me soltou e eu desapareci completamente  até ser só menos que um vestígio teu não aconteceu – você precisa que eu acredite que você não é assim antes você fosse outro homem quereria que eu lutasse contra provavelmente  daria uma boa surra em si mesmo você diria que esse não é você, que não pode ser os sons comuns distorcidos  como membros em ...

ouço,

ouço  que não é tanto assim, não pode ser trata-se de impressão. eu inventei  o equívoco  por livre escolha  algum homem que não conheço há muito disse  que o modo como sinto era fora da curva  e a história ficou por isso mesmo ouço que careço de resiliência e que conduzo a rotina de modo desenfreado  em desnecessários extremos   e pensamentos polarizados que tenho dever moral de evitar. ouço  sempre sentada do outro lado a uma mesa de distância  que existem formas mais corretas de ser . como se eu não enquanto , mas semeada tal qual joio ouço  que meu passado não precisa ser revisitado que daqui pra frente basta cumprir a cartilha dos marcos comuns. que estou atrasada que eu sou defasada e permaneci lá atrás  pois me foquei em banalidades. ouço  que sou demasiado autocentrada e que lá fora é preciso persuadir a realidade  e me fazer capaz  e me fazer sólida  e me fazer impenetrável  e que isso q...
mergulhadas as mãos através  dos meus dentes rangendo arrombou a escalada profusa entre o ácido  que retorna à garganta foi-se minha úvula e glote e cordas e todas demais estruturas apenas obstáculos no seu caminho e profanou o embrião a nascente  de qualquer palavra. amaldiçoou-as por te afligirem e espelharem para outrem o genocídio  das minhas convicções basais, você  entornou o sentido delas sequer existirem e reclamou cada segundo por nelas estar supostamente exposto e crucificado, elevando contra mim a voz e os punhos, quando jamais ousei versificar seu nome. e foi sobre sua reputação, a consciência coletiva os transeuntes à beira dos teus palcos a perspectiva externalíssima de quase desconhecidos e suas futuras presas em potencial  afinal, o que pensariam eles de você afinal você  um homem de ouro "o cara gente boa de todo rolê" depois foi sobre o que descobriria sobre si mesmo  e de que forma seria capaz de lidar com o próprio reflexo...
coleciono " vai passar " e " basta ter paciência " e " fique calma " – essa sendo a pior coisa a se dizer para alguém em sofrimento – isso já faz 15 anos todos eles a repetir jargões  sempre contidos no privilégio  de estarem do lado de fora  mas nunca ousaram mentir tanto a ponto de dizer  que um dia eu teria  um dia haveria para mim uma vida valiosa coleciono " eu te amo " cuja escavação posterior, falanges carne viva,  revelou espinhas de narcisismo, mentiras  ou apenas enganos circunstanciais  – que eu tenho de perdoar e eufemizar coleciono algozes, então  certeza absoluta  de seus papéis  que hoje se mostram apenas humanos que não me amaram e eu tenho de pronunciar mais uma vez " tudo bem " coleciono culpas maiúsculas   em necessidade  de serem endereçadas apenas a mim, e a mais ninguém  coleciono ser, constantemente, desumanizada  reduzida a um  menos consciente animal arisco e necrófago a roer a própr...
ser obrigada,  por ímpeto de sobrevivência ,  a abrir mão de você é,  na verdade, como fechar os punhos  e me socar repetidamente   mas esse meu rosto  é mais inchado pelo choro eu pensei mesmo que seria capaz de driblar seus maus hábitos  – sempre nos pensamos especiais a ponto de que aquilo não se repita sua boca faz coisas terríveis  suas mãos fazem coisas terríveis  e o seu corpo me odeia   concomitantemente  ao prazer que o meu próprio lhe concede  de adentrar   e revirar tudo eu odeio quem seu ódio me tornou na sua presença. você me leva a limites que eu desconhecia e me torna outra, um alter ego reflexo, oposta aos meus padrões  você me apresenta a agressão  como única forma  de suprir uma necessidade e traz à vida  o pior de mim as juras doces se tornaram gritos acusatórios e os abraços, contenções físicas que machucam seus dedos delicados circundando meus lábios são agora mãos sufocando meus g...
"eu não sou esse monstro  que você descreve",  você diz, em tom de injustiça, e eu me convenço ser sua algoz enquanto você me apunhala  repetidamente – e eu já nem imploro para parar – você me fez entender que eu mereço  como penitência   e não permito à ferida cumprir sua função  de me proteger  pelo contrário, exponho o corpo disponível, no ponto, seja abraço ou um tapa – o que vier de você  você decreta e falar já não posso tampouco escrever e em breve respirar seguirá o mesmo curso   "eu não sou esse monstro", você diz enquanto eu sou esse espelho que te reflete o dobro do seu tamanho "você está cega de raiva", você diz, enquanto eu enxergo muito bem os vários motivos para senti-la "você me fez chegar a isso",  é o que eles dizem logo após espancarem você  e te exilarem da realidade comum e engolimos como uma verdade amarga naturalizadas como despidas de razão   não importa o quê  "me perdoa", eles repetem – não é ar...

ele

é ele no despertar de madrugada, apavorada, vestida de suor – um único travesseiro na cama  é ele  na coluna que range e nos pés que se arrastam  e desistem frente à pia da cozinha  nas mãos sem pressão  já meio deformadas  pelos socos patéticos  ao longo dos anos é ele no pão integral,  no café solúvel  no choro matinal que talvez acorde os vizinhos é ele em cada uma das dez pílulas  – especialmente nos calmantes e no anticoncepcional é ele na esperança ao olhar para as cartelas de sedativos  que escondo com carinho é ele, senhor, nos cacos de vidro no sangue que coagula onde pinga abandonado na cerâmica  pois eu já não ligo é ele, sim, nos cabelos que caem aos montes nos cigarros que fumo à beça  nos textos que jamais virão a público  no mutismo traído apenas pelo grito é ele no imploro da minha fisiologia e eu também não ligo ainda ele nas mensagens que não chegam porque não podem mais chegar mas a cada ligação avu...